85 dias no hospital, 14 cirurgias e um sorriso no rosto que
convence. Maristela Stringhini, 40 anos, busca agora no passado a força que precisa para viver o presente. Dentro do quarto no sétimo andar do Hospital Regional do Alto Vale,
em Rio do Sul, há quase três meses, ela aprendeu que a vida surpreende mesmo quando tudo parece não ter fim. O médico e anjo, como Maristela mesmo o reconhece,
Amir El Haje, explica que ela terá de ficar mais uma semana na unidade de saúde e poderá voltar para casa, em Lages. Apesar da alta, o tratamento ambulatorial
continuará em casa e com visitas semanais na clínica do cirurgião plástico em Rio do Sul.
O quarto do hospital já ganhou
até decoração. Tem mural de fotos da família e amigos e um quadro entalhado em madeira com a frase que ela lê todos os dias: "eu sou Deus, ilumino
toda terra/ a minha voz ecoa por entre os montes ". O sinal de fé não está apenas na parede, mas mudou a vida de Maristela após o acidente que sofreu no dia
13 de abril, quando ficou presa sob uma Saveiro e foi arrastada por 800 metros no Centro de Rio do Sul:
— Agradeço muito a Deus e a todos que torceram
por mim. Agradeço agora até por um copo de água que eu consigo tomar com as próprias mãos. Sou uma pessoa melhor.
A autonomia para
conseguir se maquiar, pentear os cabelos e andar sozinha, sem a ajuda de ninguém, foi conquistada há cerca de vinte dias. Ela se diverte em saber que agora pode levantar os
braços e botar a mão na ponta do nariz. As pernas ainda doem, porque foram delas que foi retirado parte do tecido para servir de enxerto ao tórax, ombro e seios. Alguns
curativos são feitos no hospital sob efeito de anestesia, no centro cirúrgico, mas nos próximos dias poderão ser feitos na clínica e em casa.
— Daqui uns dias vou sair do hospital, mas meu tratamento será muito longo. Por mais que eu queira me desvincular disso tudo, eu não posso. Por isso vou
ser feliz, mas com meu tratamento junto — garante Maristela.
Para as horas passarem rápido e com uma pitada de humor, ela conta com ajuda da mãe,
Ana Lidia, das duas irmãs, Marli e Marlene, e das cunhadas, Silvana e Jussara. Marli está de atestado — ela é professora de Educação Infantil em
Lages — e dividiu nos últimos dias as alegrias e angústias da irmã.
Em certas manhãs há momentos de choro, mas na
maior parte do tempo só risadas que são ouvidas do quarto no sétimo andar do hospital.
— Abri mão de toda minha rotina para
ficar com ela. Todo dia temos uma visita de um médico diferente e fazemos festa. Parece que conhecemos todo mundo aqui do hospital há tempos. Não tem
explicação o amor que sinto pela minha irmã — confessa ela.
Em uma semana, ela sairá do hospital e voltará à Lages,
onde mora com a família. Maristela ainda sente um pouco de medo de ficar longe de todo o apoio que tem recebido na unidade de saúde, mas não vê a hora de ficar
perto da filha de 12 anos, Vitória. Sobre os planos futuros não gosta de pensar muito, quer mesmo é viver cada dia de uma vez:
— Quero rever
meus amigos, quero viver. Vai ser difícil porque a gente fica com medo do que ocorre do lado de fora e aceitar tudo isso. Mas agora é viver e ser feliz. Quero botar em
prática alguns projetos, que eu tinha mente e ia deixando por comodismo. Pequenas coisas se tornaram grandes coisas para mim. Quero dizer mais eu te amo, quero aproveitar mais a vida
e dar mais valor a ela, porque Deus me deu uma nova oportunidade.