O Centro de Tradição Gaúcha (CTG) Sentinelas do Planalto, de Santana do Livramento, Fronteira Oeste do Rio
Grande do Sul, se tornou alvo de críticas no meio tradicionalista gaúcho após se oferecer para receber a cerimônia de um casamento coletivo, que pode contar com
união homoafetivas. Antes de entrar em polêmica, o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) ressalta que a entidade envolvida não é parte do movimento
estadual.
"Não reconhecemos nenhum CTG com esse nome. É um clube. Para nós, não tem importância o que eles vão fazer
lá. É um problema deles, como se fosse evento em algum outro clube", resume o presidente do MTG, Manoelito Savaris, por telefone ao G1.
Apesar de
descartar uma possível punição ao CTG, justamente por não ser um centro reconhecido, o MTG questiona a razão das atividades. "Será que
há outros interesses por trás disso? Eu não sei se é social, cultural, eleitoral, mas não tenho nada a ver com isso", finaliza Savaris.
Alvo de críticas entre tradicionalistas, o patrão do CTG, Gilberto Gisler, 47 anos, é advogado e presidente da Câmara de Vereadores do
município. Ele critica a reação contrária à cerimônia. "Desde então surgiram questionamentos de como casar gay em CTG. Isso é
discriminação. Na verdade o CTG está à disposição de casamento coletivo para regularizar muitas situações de famílias que
vivem juntas, mas que não possuem dinheiro para bancar um casamento", explica ao G1.
O casamento coletivo deve ser realizado no dia 13 de setembro deste
ano, em plena Semana Farroupilha. "No mês farroupilha algumas audiências serão realizadas no CTG e com todos os participantes pilchados", explica o
patrão do Sentinelas do Planalto.
Disposto a enfrentar polêmicas, o patrão se diz amparado pela lei para garantir o evento no CTG.
"Não é certo que teremos casamento entre homossexuais, mas se tiver, é da lei. Quem é contra deveria se posicionar antes da criação da
Lei", defende Gisler.
Em nota, a juíza responsável pelo casamento coletivo, Carine Labres, da 3ª Vara Cível de Santana do Livramento,
reforçou a ideia da realização da cerimônia na entidade tradicionalista. Segundo a assessoria da magistrada, 30 casais devem participar do casamento, mas
não há nenhuma confirmação de casamento entre homossexuais.
"O segundo casamento coletivo será realizado em setembro de 2014,
dentro de um CTG de Santana do Livramento, como forma de homenagearmos a Semana Farroupilha. A ideia surgiu quando assumi a Comarca, pois pretendo, como evento, prestigiar a cultura local,
fortemente arraigada nos valores e princípios da Revolução Farroupilha", descreve.
'Estamos obedecendo à carta de
princípios do MTG'
A polêmica começou a tomar forma em abril deste ano. Desde que chegou a Santana do Livramento, a juíza
Carine Labres realiza casamentos coletivos no município. O primeiro deles foi realizado no fórum e contou com 56 casais na cerimônia. Segundo a assessoria da magistrada,
a meta é organizar um casamento coletivo por semestre.
O patrão do CTG Sentinelas do Planalto, Gilberto Gisler, acompanhou a primeira cerimônia
e resolveu oferecer a entidade que comanda para a realização do segundo casamento coletivo de 2014. "A Dra. Carine aprovou a proposta e fomos amadurecendo a ideia.
Estamos alocados numa área do município, em comodato, nada mais justo que de se colocar à disposição da Justiça local", reforça, ao
explicar que há 10 anos está à frente do centro. "Me criei no meio tradicionalista. Estou na patronagem há 10 anos. O CTG estava abandonado. Assumi e
remodelamos a estrutura", conta.
Sem fugir de polêmica com o MTG, o patrão da entidade garante que não está desobedecendo aos
princípios do movimento. “Estamos obedecendo à carta de princípios do MTG, que diz que a família é a base da sociedade”, reforça
Gisler.
A juíza Carine Labres endossa o discurso de legitimidade junto ao MTG e desafia para novos debates acerca de preconceitos sobre
orientação sexual. “Analisando a Carta de Princípios e o Código de Ética Tradicionalista, não encontramos nenhum regramento proibitivo
expresso da presença e da participação de gaúchos homossexuais em centros de tradições gaúchas”, comenta. “Justamente, [a ideia
é] trazer o assunto para debate e desmistificar, de uma vez por todas, que gaúcho pode, sim, ser gay e pode expressar essa orientação em qualquer meio”,
opina.
'Não fazem parte do Movimento Tradicionalista'
Segundo o presidente do Movimento Tradicionalista
Gaúcho, Manoelito Savaris, o MTG não se posiciona contrário à realização do casamento, apesar de não indicar cerimônias coletivas em
entidades tradicionalistas. “Em um CTG, não há recomendação para casamentos coletivos, homoafetivos ou não. Acontece algumas vezes de algum casal de
associados que convivem no mesmo CTG de realizarem casamento, até religioso, no CTG. Não há problema. Mas coletivo é complicado. Não se sabe o interesse
cultural das pessoas, se adeptas do Movimento Tradicionalista”, argumenta.
No entanto, o presidente é enfático quando é solicitado a falar
sobre o CTG Sentinelas do Planalto. “Não fazem parte do Movimento Tradicionalista. Não sei dos seus objetivos, de suas atividades. Não conheço estatuto,
suas estruturas, se tem sócios, se é uma família que administra. Não sei se têm assembleias. Eles estão desde 1999 afastados”, diz
Savaris.
A polêmica sobre ser considerado Centro de Tradições Gaúchas é debatida pelo patrão do CTG de Santana do Livramento.
“Continua CTG, tem o número de inscrição e o estatuto. O CTG é filiado ao MTG, mas está com dois ou três anos de atraso. Investimos em
estrutura na entidade e não temos dinheiro sobrando para pagar o MTG”, reconhece Gilberto Gisler.
Com a realização do casamento, o
patrão do Sentinelas do Planalto diz não temer retaliação do MTG. "O MTG vai ser contra. Vão nos penalizar, tenho certeza. Mas tenho argumentos que
mostram que nossa posição está dentro da carta de princípios e iremos até o fim se preciso. Os mesmos radicais que criticam nossa postura são os
mesmos que são contra a inovação da pilcha. Aqui se usa muito a bombacha uruguaia e a argentina, que são mais justas. Como eles impedem, os jovens são
afugentados dos CTGS", emenda.