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28/09/2021 | 16:55 | Polícia

Polícia Civil indicia freiras por maus-tratos, racismo e tortura de idosas em lar de Santa Maria

Religiosas que trabalhavam no Lar das Vovozinhas responderão pelos crimes que teriam sido supostamente praticados nos anos de 2018 e 2019

Religiosas que trabalhavam no Lar das Vovozinhas responderão pelos crimes que teriam sido supostamente praticados nos anos de 2018 e 2019
Instituição informou que desde o acontecido vem tomando medidas para evitar novos problemas - Gustavo Ruviaro / Especial

Duas freiras que trabalhavam no Lar das Vovozinhas, em Santa Maria, na Região Central, com cerca de 130 idosas acolhidas, foram indiciadas pela Polícia Civil por suposta prática de tortura, racismo e maus-tratos. 


Conforme investigação conduzida pela delegada Débora Dias, da Delegacia de Proteção ao Idoso, foram constatadas práticas de torturas físicas e psicológicas, além de maus-tratos a pelo menos quatro idosas. Os nomes das religiosas não foram divulgados pela polícia. Mas GZH apurou que as indiciadas são Terezinha Benetti, 76 anos, e Marli do Carmo Pena, 59. Elas trabalhavam no lar até agosto de 2019, quando foram afastadas em definitivo de suas funções na instituição após decisão do Ministério Público.

A defesa das freiras promete provar a inocência das duas suspeitas.

As denúncias dos maus-tratos chegaram inicialmente ao Ministério Público em junho de 2019, quando o promotor Fernando Chequim Barros, determinou a abertura de um inquérito civil. Dezenas de testemunhas foram ouvidas pelo próprio promotor, entre funcionários da limpeza, técnicos em enfermagem, enfermeiros, assistentes sociais, médicos e dirigentes do Lar das Vovozinhas. Foi esse procedimento que levou ao afastamento definitivo das religiosas. Antes, a própria direção do lar havia realizado uma sindicância interna que havia determinado suspensão temporária às freiras.

Após isso, o promotor encaminhou as informações para a Delegacia de Proteção ao Idoso para a abertura de um inquérito policial. A investigação começou em em julho de 2020 para apurar possíveis responsabilizações criminais às religiosas.

Conforme a delegada Débora, para a conclusão do inquérito, foram tomados como base os depoimentos colhidos pelo Ministério Público. Além disso, outras testemunhas foram ouvidas, como familiares de algumas idosas e outras pessoas que teriam presenciado alguns dos fatos. De acordo com a delegada, os depoimentos são praticamente idênticos, o que sustenta o indiciamento:

— Vieram muitos depoimentos e todas no mesmo sentido. Alguns fatos não conseguimos indícios probatórios suficientes para indiciamento. Mas aqueles pelos quais indiciamos, aqueles fatos ficaram bem comprovados — afirma a delegada.

Os crimes imputados
Terezinha Benetti foi indiciada por dois crimes: tortura e racismo. Os casos, segundo a Polícia Civil, ocorreram entre 2018 e 2019. O indiciamento de racismo contra a freira recai por conta de ela ter supostamente impedido que uma idosa, de 86 anos à época, participasse de um evento realizado no lar.

Conforme o relato da própria idosa, em 4 de maio de 2019, ocorreria um desfile de escolha da Rainha e Princesas do Lar. Quando ela se preparava para ir ao local onde estavam as demais idosas, teria sido impedida por irmã Terezinha que disse, segundo relato da vítima ao promotor: "Tu não vai descer, negra fedorenta. Preta e suja não pode se misturar com os brancos".

O outro crime pelo qual Terezinha foi indiciada é o de tortura. Conforme depoimentos de diversos funcionários do Lar, em uma oportunidade, a irmã teria deixado uma idosa, com então 70 anos, nua por mais de uma hora após o banho. Isso porque a idosa cadeou o seu quarto com a chave dentro. A situação foi confirmada também por uma irmã da idosa em depoimento à Polícia Civil.

Além disso, funcionários relataram que Terezinha teria racionado o uso de sabonetes e xampu, obrigando que diversas idosas compartilhassem o mesmo produto, o que poderia ser prejudicial à saúde das acolhidas. Ela era supervisora da Ala 4 do lar.

O indiciamento por maus-tratos recai sobre a irmã Marli. Duas situações foram relatadas por diversas testemunhas. Conforme a investigação da Polícia Civil, a freira teria feito suturas, ou seja, costurou, escaras de uma idosa de 80 anos. As escaras são tecidos da pele que "morrem" devido a pessoa ficar muito tempo em uma mesma posição.

Segundo enfermeiros do lar, além de fazer as suturas não ser um procedimento indicado, elas eram feitas sem qualquer tipo de anestesia. Por conta disso, a irmã também teria impedido que a idosa fosse levada para atendimento médico.

Em outro caso, Marli também teria realizado um procedimento de forma inadequada que causou intenso sofrimento a uma idosa de 93 anos. Ao limpar uma ferida interna da acolhida, a freira teria supostamente introduzido apenas uma pinça no machucado, também sem anestesia, causando sangramento.

O que diz a defesa
Em depoimentos no inquérito civil do Ministério Público, tanto Marli quanto Terezinha negaram todas as acusações. Irmã Terezinha chegou a ser intimada para prestar novo depoimento e compareceu até uma delegacia em Capão da Canoa, onde está morando atualmente e atuando em uma instituição de caridade. No entanto, preferiu não declarar nada, alegando que já havia dito tudo ao promotor em Santa Maria.

A irmã Marli mora em Manaus e, por isso, naquele momento, não foi inquirida novamente. O advogado delas, Daniel Tonetto, disse à reportagem de GZH que "durante o processo criminal será demonstrada a inocência das duas freiras".

O que diz o Lar das Vovozinhas
Ambas as freiras fazem parte da Congregação Filhas de Santa Maria da Providência, com sede em Porto Alegre. Irmã Marli era contratada com uma carga horária de 40h semanais. Já Irmã Terezinha atuava no Lar por conta de um convênio da Congregação com o Lar das Vovozinhas.

O Lar das Vovozinhas, que já havia realizado uma sindicância e afastado as freiras, em um primeiro momento de forma temporária e, depois, definitivamente, por ordem do Ministério Público, se posicionou. A vice-presidente da instituição, Liliane Mello, ressaltou que a direção do lar tomou as medidas cabíveis:

— Na época que o fato aconteceu, foi aberta sindicância e a documentação foi encaminhada ao Ministério Público. Como não estava no lar à época, não posso comentar mais do que isso. Agora há todos os trâmites desse processo. Hoje, temos um trabalho contínuo com a equipe com treinamentos. Também sempre buscamos identificar a existência de fatos a partir de qualquer tipo de relato.

Fonte: GZH
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